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sábado, 6 de junho de 2015

GR22 : Day One - The beginning

GR22 - A Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal
A true self-supported bikepacking adventure.

Day One - The beginning


A semana que antecedeu o meu arranque para a Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal não foi de todo fácil. O muito trabalho e o pouco tempo disponível não me permitiram a preparação e atenção que a aventura merecia. No entanto, Sábado estava a sair exactamente à hora que tinha pré-programada. Às 7am estava a fazer-me ao caminho, mas ao invés de estar a sair de Sortelha como programado, estava a sair de casa, em Oeiras.




Quando cheguei a Sortelha pouco passava das 10am e estacionei o carro no primeiro sitio que vi, em frente a um café/restaurante e que tinha inclusive uma sombrinha livre.
Neste café e depois de preparar tudo, comi mais qualquer coisa, bebi uma coca-cola, café e arranquei. Não disse nada a ninguém, não avisei ninguém que ali iria deixar o carro cinco dias seguidos, nem tal necessidade me passou pela cabeça. Mas Sortelha é uma aldeia e como boa aldeia que é, qualquer coisa fora daquela rotina é estranha. O meu carro, que ninguém conhecia, entrava claramente nessa categoria...

Largando este povo quase às 11am deixava-me numa situação complicada para cumprir o meu objectivo no que tocava às distâncias diàrias a percorrer. Mas foi com uma boa moral que me fiz ao caminho. O chip já estava no modo "aventura" e tudo foi acontecendo tranquilamente, sem pressas. As horas já não faziam tanto sentido, ou pelo menos preocupar-me com o tempo já não fazia tanto sentido.


Os primeiros quilómetros ajudaram a esquecer tudo o resto. Pareceu ser sempre a subir até ao Sabugal, onde parei para almoçar, pertinho das 12am. Essencialmente boas pistas, bosques de carvalhos a providenciarem belas sombras e caminhos mais ou menos fáceis. Mas de elevada exigência física, já que todas as subidas são fortes, empinadas e algo extensas. Começava a desenhar-se o que supunha ir ser a rotina das dias vindouros.

Sempre que podia abastecia de água. Quando cheguei ao Sabugal, 18kms depois de ter partido, já tinha os 3L de capacidade do camelbak cheios de ar. E esta havia de ser a rotina maior. De povo em povo, de fonte em fonte, à procura do milagroso líquido.
No Sabugal almocei e falei pela primeira vez com o meu primo Tiago que disse que teria o 110 disponível para me ir buscar se assim tivesse que ser. Ri-me e disse-lhe que não havia de ser preciso, mas afinal estive bem perto de me ver obrigado a tal. Mas disto, nem eu nem ele desconfiávamos.



Volto a parar na barragem de Alfaiates, ainda antes da aldeia com o mesmo nome. Os dois quilómetros que antecederam esta paragem foram muito duros, literalmente a empurrar a bicicleta por pseudo-caminhos entre muros que não viam pegadas de gente ou de bichos à vários anos.
Trabalho árduo em progredir no terreno e quanto mais lento eu seguia, mais longe ia ficando do objectivo final para este dia, Almeida.
Mas na barragem de Alfaiates e à sombra fiz uma paragem mais demorada, onde fui inclusive a uma banhoca. Eram perto das 14pm quando aqui cheguei e o Sol e o calor estalavam a pino e inclementes sob um céu muito azul.
No entanto, o tempo mostrava-se instável. Conseguia perceber os muitos e pequenos farrapos de algodão branco, inofensivos, a acumularem-se no horizonte, ganhando corpo e um tom mais acizentado e pesado.
Paro novamente no café da aldeia de Alfaiates, onde bebi um mini fresquinha que me soube pela vida e atesto novamente de água, agora atesto também os cantis, já ambos quase vazios.


Uma horta e couves à mão de semear fez-me regressar no tempo algumas horas atrás e rever mentalmente uma determinada conversa, e a bem da verdade e a ter que ser, acho que preferia correr atrás de um javali ou tentar apanhar tordos! 
Do que um gajo se vai lembrar, eheheh...

Por esta altura não tinha bem noção do calor que estaria eventualmente.
Comecei a tomar consciência disso ao ver a cara das velhotas sentadas nos bancos à sombrinha quando eu passava por elas e lhes deitava um "Boa tarde"...



Depois do "Boa tarde" de resposta todas elas me atiravam a mesma frase, a mesma admiração;
"Oh menino, de bicicleta por aqui? E com este calor?!"

Na maioria das vezes, sorria, e seguia viagem. Em duas delas, sentei-me ao lado das velhas e descansei. Que sossego e paz têm aquelas alminhas à disposição!
Durante as curtas conversas que tive com algumas das poucas pessoas com que me cruzei, ninguém conhecia o percurso, ou tinham apenas uma vaga ideia do mesmo, não costumavam ver muitas bicicletas e mesmo malta a pé, muito pouca. Apenas a referência às Aldeias Históricas lhes fazia algum sentido.
Um percurso ainda muito jovem, em claro contraste com a vivência daquelas gentes e idade daquelas pedras.



Sigo junto à ribeira de Alfaiates até à povoação de Rebolosa, para depois ir junto do rio Cesarão até Vilar Maior, sempre por caminhos exigentes, fechados, agressivos e lentos.





A aldeia de Freineda serviu de ponto de passagem do Côa. Castelo Mendo estava agora a poucos quilómetros de distância e face às horas, tinha já definido esta como destino final do dia. Não iria chegar a Almeida ainda com luz do dia e não tinha levado mais luz que o meu frontal. Daria eventualmente numa situação de emergência, mas não era de todo o caso e optei por procurar um bom local para pernoita na povoação de Castelo Mendo.







A última subida a este povo foi brutalissima. Para mim, um disparate, mas pronto. Umas paredes inclinadíssimas para ir ganhar uma porta medieval numa zona das muralhas que está cheia de lixo e mal tratada. Muito mais lógico ganhar a entrada principal da vila pela estrada que já se levava, mas pronto, admito que fosse o cansaço já a falar mais alto.
A vila de Castelo Mendo é muito bonita, bem tratada e convidativa, com umas vistas sobre os montes e vales vizinhos que são qualquer coisa, principalmente ao pôr do sol que se mostrava em tons rosáceos e alaranjados com elevado fulgor.

Ainda antes de ligar para casa, encontrei o lugar ideal para passar a noite, na rua do Tribunal, abrigado debaixo do alpendre da casa Nº7.
Julgava que iria ter trovoadas e talvez chuva por companhia durante a noite. O tempo tinha vindo a fechar um pouco, percebia-se a electricidade estática a crescer no ar, carregado e abafado, aquele ar típico das trovoadas de verão do interior.
Algum vento compunha o serão.

Enquanto preparava as coisas apareceu a anfitriã da familia Costa, senhora da casa em frente e à qual tratei de explicar o que estava ali a fazer. Fez-lhe um bocadinho de confusão, mas lá percebeu! Tinha dois filhos, o José de 12 e o Marco, bem mais novinho. Foram a minha companhia durante pouco mais de uma hora. O José tratou logo de ir buscar as suas bicicletas para vermos os pneus que estavam vazios e que enchemos com êxito. Se estivessem furados iria dar mais trabalho, mas também, tinhamos tempo!
Quando aqui parei pouco passava das 19h30pm e as 21pm já os putos tinham ido jantar e já eu me estava a enfiar dentro do saco-cama, de janta comida e tudo tratado, inclusive atestado de água com 3 garrafas de 1.5L frescas que o José me trouxe da arca frigorifica da mãe!


Depois de jantar meti-me a fazer contas.
Hoje tinha concluído somente 80kms entre Sortelha e Castelo Mendo. 80 dos 95kms que tinha estipulado para o dia de hoje! Para estar dentro dos prazos que tinha definido teria que ter alcançado, pelo menos, a povoação de Almeida, a 15kms de distância.

Se tivesse partido às 7am, ao invés de partir às 11am, claramente que teria dado para chegar a Almeida, pelo que mantinha a moral em alta e o cansaço proveniente de um dia duro de pedal era minimizado por essa espectativa ilusória de que são feitos os sonhos.
A carga que trazia às costas era perfeitamente suportável e vinha estável. A bike e respectivas mudanças perfeitamente acamadas, sem saltos e os pseudo-alforges a aguentar na perfeição.
Até o simples facto de estar a dormir no alpende de uma casa com o meu Nº de escola primária e secundário, o 7, parecia um desigino do destino favorecendo a empresa, que esta minha aventura tinha tudo para correr bem e que absolutamente nada poderia correr mal.

Hoje, já em casa e no conforto do sofá, garanto-vos Amigos, como são boas e confortáveis as espectativas e as ilusões!


Continua aqui...



4 comentários:

  1. adorei o relato, adorei as fotos mas adorei ainda mais que te lembrasses da conversa a olhar para as couves :p [e sim, como é doce a ilusão!]

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  2. Boas Fred,
    Até agora estou a curtir imenso da crónica... estou a ter a sensação de estar a pedalar pelos locais que passaste... estrondoso... há-de chegar o meu dia de fazer algo do género

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    1. Viva Ricardo! Obrigado pelas palavras!
      Aconselho-te vivamente. É uma experiência ligeiramente diferente dos Camiños!

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